Hell-o, people!!! Sem demoras e sem enrolações, eis mais um capítulo, mais um conhecimento sobre o cenário de RPG "Demônio, A Queda".
Bora lá!
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15. Humanos [Assombração]
A colher começou a descer. Seria rápido, uma vitória digna, mas, então, ela escutou seu nome. Veio através da noite, entrando sobre as camadas de outros pensamentos dela, era um apelo, um pedido de socorro com a voz de Aníbal.
Seus olhos se arregalaram ao constatar que havia medo na voz dele. A colher parou e toda sua linguagem corporal mudou enquanto ela analisava o quão fraca estava a voz dele. Não houve o que questionar. Teria matado o Caído a sua frente em outras eras, teria feito isso agora mesmo, mas Aníbal era mais importante, ele era algo… Alguém que realmente importava.
Tural estava tonto, no chão, quando viu a mulher expandir suas asas e sair voando. Por alguma razão, ela saiu sem dizer coisa alguma, poupara-lhe a vida. Não entendeu nada. Resignou-se a continuar deitado, concentrando-se para curar alguma coisa de si, para rastejar de volta a seu lar. Lembrou-se da primeira noite em que chegou a esta realidade e foi até sua casa. Um déjà vu amargo de corpo e roupas maltratados sob um chuveiro, enquanto deveria manter o máximo de silêncio, zelando pelo sono de Dona Adelaide no quarto ao lado. Manteria silêncio novamente.
* * *
Dolores estava com pressa e agonia. Corria pelos céus na noite tentando mentalizar as palavras de Aníbal. Não conseguiu se conectar através da invocação por tempo suficiente para entender o problema. Não conseguia contatá-lo de volta. Quando demônios são invocados por seus Nomes, sejam Celestiais, ou Verdadeiros, se tiverem sorte, conseguem observar detalhes sobre quem está chamando; ela conseguiu ver pouco, mas era melhor do que nada. Aníbal ainda estava em casa, pôde ver o tapete horrível que ele tinha no escritório do cofre. Ela ainda estava longe, mas sua determinação a impulsionava.
Demorou quase meia hora para conseguir chegar até a casa de Aníbal, do lado de fora, tudo parecia calmo, mas quem soubesse procurar, sentiria que algo estava errado. Circundava a casa, concentrando-se nos sons, passando alguns grilos, após um barulho raso de trânsito a duas ruas adiante, escutou o “tinc-tinc-tinc” de uma atividade repetitiva.
- Fica quieta! – o grito cortou o silêncio, era uma voz estranha.
Dolores estava próxima a uma das janelas da biblioteca de Aníbal, conseguiu ver três homens mexendo no cofre, enquanto Aníbal e a esposa estavam rendidos, no chão. Perguntou-se por qual razão Aníbal não abriu o cofre e terminou com aquilo, mas ao ver que o corpo dele não se mexia, lembrou-se da voz fraca ao chamá-la. Um ímpeto de raiva correu pelo rosto. Apertou a colher com força, já havia deixado de usá-la com a tal Débora, mas parece que ainda teria chance de usá-la nesta noite. Precisava afastá-los do casal.
Esgueirou-se pela porta dos fundos, pela cozinha, já estava aberta. “Devem ter entrado por aqui…” pensou. Caminhou devagar, tentando captar os detalhes de seus alvos. Lembrou que havia um sino de vento na sala onde almoçara, resolveu que seria sua isca. Concentrou-se e invocou o vento. Os fragmentos do sino se tocaram levemente, produzindo um som suave, mas alto o suficiente naquela noite silenciosa.
- Hein?! – disse um dos assaltantes. – Oh, guri, vai lá ver isso! Vê se alguém entrou na casa.
O mais baixo dos três homens foi em direção ao som de sinos. Os outros dois ficaram trabalhando no cofre.
O assaltante baixo chegou até a sala. Estava tenso, parecia um novato no trabalho. Dolores não pensou duas vezes, chegou por trás dele e colocou a colher contra sua pele. - Quieto… Quietinho… Shhh… - ela pressionou mais a colher – Acho que você entende que eu não vou hesitar em usar isso…
- O que… - ele sussurrou.
-Shhh… Eu quero é que você cale a boca e largue a arma devargar… Ou a sua tentativa patética de avisar seus amigos vai acabar aqui mesmo…
O assaltante mais baixo curvou-se para largar a arma. Dolores aproveitou para abatê-lo ali mesmo, usou uma versão corrompida de sua invocação da Doutrina do Despertar para deixar o homem efermo, debilitado e imobilizado. “Faltam dois…” pensou consigo mesma.
O assaltante de cabelos platinados começou a ficar incomodado com o silêncio. Fez sinal para seu cúmplice parar o trabalho e ir verificar. O assaltante mais alto olhou para a esposa de Aníbal, pensando no que fazer, por fim, arrancou a fita que prendia uma das cortinas e prendeu suas mãos atrás das costas, deixando-a jogada contra a parede.
- Se você fizer qualquer coisa, eu volto aqui e mato o teu marido… Tá me ouvindo?! – falou baixo e de forma grosseira no ouvido dela, dando-lhe um chute nas costas. – Ouviu?! Repete! - Ouvi… ouvi… por favor… - ela respondeu baixinho, em meio as lágrimas.
Dolores já se posicionava para interceptar o próximo, quando escutou o assaltante mais alto:
- Rui, Rui! Tá vendo o Dedé? – ele sussurrava, mas era possível escutar um pouco. – Dedé!
- Ainda não… Dedé… Dedé… Cadê você, cara?! – sussurrava Rui, o assaltante de cabelos platinados. – Será que ele foi lá fora ver o barulho?!
- Sei lá! Vai tu, lá fora, que eu dô cobertura! – disse o assaltante mais alto. – Tu dá volta e eu fico na porta pra ninguém entrar, nem sair.
- Tá, tá, agora, faz silêncio… - chegaram até a porta dos fundos, na cozinha – Seguinte, Xirú, eu vou dá a volta, qualquer coisa eu grito… Fica ligado, hein?!
“Dedé já está dormindo, rapazes...” Ela usava as sombras da casa a seu favor. Havia pouca iluminação para olhos humanos, mas sua habilidade da Forma Apocalíptica de Ellil “o Semblante do Vento”, lhe permitiam ver perfeitamente sob condições de baixa luminosidade.
Xirú estava parado na porta da cozinha. Ela esperou que Rui ganhasse uma distância maior entre eles, antes de aproveitar outra invocação corrompida. Desta vez, uma massa de cheiros orgânicos, fétidos e nauseantes envolveu Xirú. A sensação foi tão forte que ele não aguentou e se debruçou sobre a pia da cozinha, colocando a arma sobre o balcão. Um pouco de saliva escorreu, abrindo caminho para o vômito. Aproximou-se por trás de Xirú e finalizou o trabalho.
“Menos dois, falta um…” – pensou enquanto apressava-se para a biblioteca.
Quando Rui voltou, espantou-se com a porta da cozinha aberta, sem sinal de Xirú. Um leve odor desagradável pairava no ar, mas ao ver a pia cheia de vômito, concluiu que Xirú havia ferrado combinação deles. “Imbecil, retardado…” pensou consigo “Nenhum sinal do Dedé, agora, isso…” Entrou no corredor que conectava todo o andar térreo da casa, uma corrente de vento arrepiou sua nuca. “Mas quê…?” Não lembrava disso, quando saiu para vasculhar o perímetro. Aproximou mais a arma do corpo e caminhou devagar.
A porta da biblioteca estava fechada. Quando ele chegou até ela, fez força, mas estava trancada.
- Abre! Xirú, você taí?! É… - parou de falar ao ter que esquivar de cacos de algo que quebrava próximo a sua cabeça, na superfície da porta.
Um resto de vaso branco estava próximo a seus pés. Ficou de cócoras, tentando sair daquela parte estreita conforme outros objetos voavam em sua direção.
- Parabéns, trouxa da noite… O seu bilhete foi premiado e nós temos uns minutinhos de diversão garantida! – a voz era feminina, mas Rui não conseguia acreditar que a esposa do dono da casa teria tanta coragem, não depois de tudo que ele e seus parceiros fizeram o casal passar.
- Dona, a senhora pára, que eu vou matar… - a frase foi interrompida por outro objeto chocando-se com sua testa. Era um cinzeiro de metal pequeno que deixou um corte feio sobre o olho esquerdo.
- SE UM VERMEZINHO FEDIDO COMO VOCÊ REALMENTE PUDESSE FAZER ALGO, NÃO SERIA COVARDE, NEM TRARIA OUTROS DESEJETOS DE BÍPEDES PARA ATORMENTAR ESTE LUGAR… - Dolores estava fazendo aquilo de propósito, parte dela queria o horror nos olhos de Rui, parte dela estava tranquila por ter feito Paula se trancar na biblioteca com Aníbal e convencê-la a chamar a polícia.
Derrotar Rui seria infinitamente fácil, já neutralizara dois de seus comparsas, já usara suas habilidades de forma indiscriminada, pensou até mesmo em usar a colher, mas deteve-se por causa de Paula e Aníbal. Optou por algo mais psicológico. Manipularia o vento e a mente daquele homem, usaria o momento para praticar tiro ao alvo com as miudezas da casa (bibelôs, vasos, porta-retratos, etc.).
“Será que eu o faço crer em fenômenos paranormais esta noite?” sorriu.
- HOMEM DOS CABELOS PLATINADOS… - jogou um copo de vidro há trinta centímetros dos pés dele. – VERME SUJO, MAL QUISTO, IGNORADO… VEIO PARA A MINHA CASA, PARA OS MEUS HUMANOS… NÃO TEVE SORTE… ENCONTROU JUSTO COMIGO… - jogou um abajur – VOCÊ ACREDITA EM FANTASMAS, RUI? HAHAHAHAHAHAHAHA!!!!! – usava sua voz real.
Havia muitas coisas das quais homens como Rui jamais teria medo (outros assaltantes, briga de rua, dois policiais descendo a rua…), mas verificar que o sobrenatural não era algo que assistia na televisão, mas, sim, que era real e que ele era o alvo da “coisa”, isso mexia com as certezas dele. Parara de contar no sétimo objeto jogado contra ele, a maldita boneca de cerâmica, cuja cabeça ficou virada para ele, olhando-o (parecida com a daquele filme “Anabelle”!!!). Tentou gritar por socorro, tentou sair dali, mas objetos maiores como almofadas começaram a cair pelo chão, tornando o deslocamento ruim. A entidade com a qual estava em contato estava furiosa, ele havia invadido sua propriedade e mexido com seus protegidos (ou eram vítimas, e ele se intrometera na assombração da “coisa”?).
Dolores concluiu que era hora de terminar. O vento acalmou e os objetos pararam de voar.
- ESCUTE-ME BEM, RUI “VERME SUJO”, SUJEITO DESPREZÍVEL, EU JAMAIS QUERO VER VOCÊ DE NOVO!!!!! SE VER QUALQUER UM DOS MEUS HUMANOS NA RUA, TROQUE DE CALÇADA, MUDE DE DIREÇÃO!!!! MUDE DE PLANETA!!!! OUVIU BEM? – começou a escutar as sirenes chegando à frente da casa.
Ele balbuciou um “Sim!” enquanto tentava proteger a cabeça e controlar o corpo. De cócoras, agora, passara para a posição fetal, tremia ininterruptamente. Ela afastou a arma dele.
- BOM VERMINHO…
Com os movimentos dos policiais ficando mais próximos, Dolores correu para o andar de cima. Abriu uma janela e, aproveitando que a luz elétrica ainda não havia sido reestabelecida, voou mais uma vez.
* * *
Chegando em casa, trocou de roupa, pegou o maço de cigarros e ficou fumando olhando a madrugada se tornar dia. Insone, ela repassou a noite toda na mente.
“Uma vez assassina, sempre assassina, eu suponho…” tragou fundo o Delboro Light e jogou a fumaça no ar, como se fosse uma forma de separá-la do pensamento. “Eu estive tão comportada esses anos todos… Daí, veio essa Débora e eu fiquei assim…”. Soltou um palavrão e “o engoliu” com o resto de uma lata de cerveja. Agradeceu internamente por seu coração ainda ter alguma sensibilidade, por seus ouvidos não se fazerem surdos diante de um pedido de socorro. “MEUS HUMANOS” A mesma dupla de palavras por Caídos tão diferentes “…preciso falar com a tal Débora de novo… Argh…”.
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Revisão: Filipe Dias Tassoni (@amarelocarmesim)
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******* CAPÍTULOS ANTERIORES *******
1) FUGA [do Abismo] --- Nome Verdadeiro, Nome Celestial, Abismo e Corpo Hospedeiro.
2) LEMBRANÇAS [Paralelas] --- Casa, Adão e Eva, Lúcifer, Gehinnon (a primeira cidade), Ressonância
3) RECOMEÇO [Legado] --- Legado, Surgimento da Humanidade, Duas Ordens do Criador, Ahrimal, Grande Debate, Semblantes, Consciência, Eminência, Os nomes de alguns Anjos Rebeldes importantes na história do cenário, Miguel
4) VINGANÇA [Justiça] --- Doutrinas, o fim da imortalidade da humanidade, Casa Flagelo, Doutrina do Despertar
5) REFLEXÃO [Cautela] --- Antecedentes (Fé, Contatos, Recursos), Pacto e Ceifar Fé
6) CIGARRO [Negociações] --- Pacto (investimento), Seguidor, Tormento
7) ASCENSÃO [Poder] --- Antecedentes (Contatos), Revelação, Doutrina Primária
8) CONTATOS [Diversidade] --- conceito de Invocação (uso do Nome Celestial para comunicação)
9) CIGARROS [Delboro Light] --- Presciência Sobrenatural
10) PREPARAÇÕES [Lâminas] --- aliados
11) LÂMINA [Faca] --- absorção de um Demônio por outro
12) NOVIDADE [Vizinhos] --- características de Forma Apocalíptica
13) TIC TAC [Reunião] --- interação social
14) PRAÇAS [Cálculo - 1] --- Tormento e combate
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